A vez da emoção
Em palestra durante o III Weci, professor aponta a necessidade urgente de se trabalhar a afetividade do estudante ante a aposta conteudista
Por Tiago Gebrim
A velha história de que se educa há mais de um século com as mesmas práticas e de que é preciso mudar – mas como? Quem participa com certa regularidade de eventos educacionais já está habituado a encontrar, algum momento, afirmações similares a esta, que aparecem, provocam e deixam com respostas inconclusas a plateia.
Nesta segunda-feira, 24 de maio, em evento on-line com mais de 1400 visualizações, o III Workshop de Educação, Conhecimento e Inovação (Weci), realizado pelo Campus Ceres do Instituto Federal Goiano (IF Goiano), mais uma vez cutucou este vespeiro. O responsável foi o pesquisador e palestrante Gustavo Reis, que retornou, mesmo que virtualmente, a Ceres para participar do evento.
Em 2018, em sua primeira edição, Reis havia participado do Weci e, já naquele ano, trazia as provocações que retrabalhou, agora num contexto de pandemia, durante o evento. O pesquisador apontou o que denomina os três domínios de aprendizagem – o cognitivo, o comportamental e o emocional – e enfatizou a já conhecida ordem de trabalho levado a cabo nas salas de aula. “Há insistência em se apresentar o conteúdo, o objeto cognitivo, condicionar o comportamento e com isso apresentar uma recompensa emocional. (...) Isso não engana mais ninguém, gente... as pessoas passam a vida inteira ouvindo isso”, já deixou, logo de início.
Na sua proposta de trabalho, Reis aponta que é preciso considerar as emoções antes do conteúdo, trazendo para próximo de si o estudante, de forma genuína. “Quando se invertem os vetores e se trabalha os aspectos emocionais, as respostas comportamentais tendem a ser diferentes, com outro nível de entrega, e consequentemente o interesse pelo que será apresentado é, já de antemão, diferente”, explica o professor, apontando que em um contexto de distanciamento social tais aspectos são ainda mais importantes.
Ao falar das dimensões do processo comunicativo, o palestrante aborda que há, no mínimo, cinco fatores entre o falar e o ser entendido. Tudo começa com o que ele denomina “Eu comunicante”, aquele que tem a ideia do que se quer expressar. Em um diálogo interno, este ente conversa com o “Eu enunciante”, aquele que, efetivamente, traduz a ideia em um enunciado – neste caso, por palavras. Essa mensagem trafegará em um meio até chegar ao destinatário, em que o processo se inverte. É o chamado “Tu destinatário”, que escuta, e leva ao “Tu interpretante”, quem efetivamente compreende (ou não) o que foi comunicado.
Conforme apresenta Reis, neste fluxo básico de comunicação costumam ocorrer três problemas específicos. Primeiramente, “nem sempre se consegue dizer o que se quer dizer, no diálogo entre o “Eu comunicante” e o “Eu enunciante”. Em segundo, nem sempre é livre de ruídos o meio de trânsito das mensagens. E sobre este fato, o pesquisador aponta que “não está totalmente sob nosso controle, e ainda assim nos frustramos” quando, por exemplo, no contexto atual, há um problema de conectividade. E, por fim, “nem sempre se entende o que foi ouvido”, o que, afirma Reis, é um problema recorrente no processo escolar.
Não há fórmula mágica para solucionar as questões, mas o palestrante convida os presentes a refletir sobre o que traz inicialmente: a inversão do processo e a abertura de receptividade a partir da aproximação, do trabalho sobre o domínio emocional. “Se conseguirmos de fato construir parcerias genuína com nossos estudantes eles talvez decidam se comportar melhor, e se decidirem e consequentemente tiverem mais vontade de aprender, eles irão aprender mais e todos sairão ganhando”, afirma.
Reis trouxe duas expressões de base matemática, fundamentais para a compreensão da proposta: primeiramente, o fato de que a cognição é função do nosso comportamento, e não o contrário. “Ou seja, dependendo da forma que resolvemos nos comportar, aprendemos mais ou menos”, e não é aprender melhor que condiciona como vamos nos comportar. Em segundo, “nosso comportamento é função de nossas emoções e nossa afetividade. Elas pautam nosso comportamento de forma mais direta e decisiva que nossa razão”.
É importante lembrar que não há 100% de satisfação ou aproveitamento, e entender e aceitar isso é, nas palavras de Reis, “libertador”, e um ponto importante para livrar o professor das frustrações. Para ele, o momento, por pior que seja, precisa levar a uma nova forma de interagir e, portanto, ensinar. “Tudo isso que está ocorrendo tem de servir como ponto de partida para fazermos mais e melhor. Não é uma opção simplesmente voltarmos a fazer o que se fazia antes”, conclui.
Weci – Ocorrendo em sua terceira edição, o Workshop de Educação, Conhecimento e Inovação é uma iniciativa do Campus Ceres junto a seus cursos de licenciaturas em Ciências Biológicas e Química, com participação ativa de escolas de Ceres, Rialma e cidades vizinhas, como Carmo do Rio Verde, São Patrício e Uruana. O evento tem como objetivo central propiciar grandes encontros anuais para discussão das práticas educacionais, tornando o Campus Ceres um ambiente para trocas entre estudantes de licenciaturas, professores da região e convidados de outras instituições.
Em 2021 o evento ocorreu de forma totalmente virtual, sendo transmitido ao vivo pelo canal do Campus Ceres no Youtube, propiciando a participação mesmo daqueles não inscritos formalmente no evento. Além de Gustavo Reis, o evento contou com participação do psicólogo, educador e cantor Rafinha Acústico e do professor e humorista Diogo Almeida. Toda a transmissão foi traduzida simultaneamente na Língua Brasileira de Sinais.
Ascom Campus Ceres
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