Pesquisa e pós-graduação no Brasil: entraves, desafios e sugestões
Abrindo o Congresso de Pesquisa e Pós-Graduação, em Rio Verde, pesquisadora da UnB traz cenário de desafios e insatisfações na pós-graduação, com sugestões para uma nova perspectiva
Por Tiago Gebrim
Fotos: Ícaro Lunas
A primeira palestra do 11º Congresso de Pesquisa e Pós-Graduação (CPPG) do Campus Rio Verde, realizada nesta terça-feira, 29 de novembro, trouxe a pesquisadora Connie McManus, da Universidade de Brasília, para tratar de um assunto mais que pertinente aos propósitos do evento: os entraves ao avanço da pesquisa e pós-graduação no Brasil. McManus, que participou remotamente do evento, trouxe dados recentíssimos advindos de um relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho do Fórum de Pró-Reitores de Pós-Graduação, que foi apresentado na última semana em evento no estado de Sergipe.
As primeiras informações vêm da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Wipo), que mostrou o posicionamento do Brasil em rankings mundiais segmentados. Em termos de clusters de inovação, o País possui apenas um elencado no top 100 mundial, em São Paulo, além de outros três no segmento “middle”, em Rio de Janeiro e Porto Alegre. Em geral, a análise mostra que esses clusters se referem a serviços financeiros, que dominam a inovação em nossas terras, e relevam como pontos fracos do País a baixa produtividade e inabilidade de firmas em adotar novas tecnologias.
Um outro painel apresentado traz o benchmarking em relação a outros países do segmento Middle, em sete pilares: instituições, capital humano, infraestrutura, sofisticação de mercado e de negócios, produção de conhecimento e tecnologia e produção criativa. O painel mostra que estamos com bons números em termos de sofisticação de empresas e de mercado, mas patinando em termos de infraestrutura e instituições. “Não são necessariamente instituições de pesquisa, mas governo e legislações que temos aqui no Brasil”, informa Connie.
Seguindo a apresentação, a pesquisadora aponta que o sistema de pesquisa no Brasil é suportado pelos pesquisadores, e, dentre esse universo, mais de 90% da pesquisa em nosso País é feita dentro da pós-graduação. Contudo, não somente os professores de pós-graduação são responsáveis por isso, mas os estudantes desse segmento. “A gente tem que reconhecer a importância dos estudantes dentro desse sistema”, afirma.
Connie: "Mais de 90% da pesquisa em nosso País é feita dentro da pós-graduação. Não somente os professores, mas os estudantes de pós-graduação também são responsáveis por isso."
O levantamento realizado pelo Grupo de Trabalho fez um levantamento analisou aspectos macro dentro de legislação, agências de fomento e pesquisa, as instituições de ensino e pós-graduação e fundações de apoio, a sociedade e os órgãos de controle. Em cada um deles, McManus apresentou os problemas e inquietações indicados por seus integrantes. Uma das palavras mais citadas, pelos pesquisadores, foi “medo”, seguida por “falta de gestão”. No mesmo caminho, em se tratando das agências de pesquisa, a falta de política nacional e de definições de prioridades específicas para pesquisa engrossam o caldo, que se derrama mostrando um cenário quase desolador para o ânimo dos potenciais pesquisadores.
Com quase 200 depoimentos de professores de instituições de ensino e pesquisa, o relatório do grupo mostra que sentimentos de morosidade e falta de apoio institucional, além da burocracia, colaboram para tornar a pesquisa acadêmica desinteressante. Uma das críticas correntes é o fato de não haver reconhecimento institucional ou mesmo vantagens financeiras para os professores que se dedicam à pesquisa, em vista daqueles que seguem com o trabalho docente padrão.
O trabalho do professor de pós-graduação envolve lecionar, administrar, pesquisar, orientar, cuidar do laboratório, publicar e ainda fazer extensão, afirma Connie, mostrando logo em seguida que atualmente os docentes dispostos a isso representam menos de 40% do efetivo das instituições. “Muitos professores novos de universidades não querem fazer pesquisa. ‘Pra quê, não adianta nada, a gente não tem reconhecimento, só ganha dor de cabeça’”.
A situação do estudante – Outro ponto de extrema importância do relatório e da fala de Connie referem-se à cultura nacional que não reconhece a atividade do pesquisador em formação como trabalho. Assim, os estudantes de pós-graduação trouxeram queixas como a desvalorização inclusive em seio familiar, que muitas vezes os veem como estudantes, desconsiderando a pós-graduação como uma atividade laboral. Para McManus, “é preciso tratar os estudantes como profissionais de pesquisa”, fala válida inclusive para os próprios orientadores.
Além disso a insegurança quanto a empregabilidade pós mestrado e doutorado e a dificuldade em cuidar da saúde são fatores elencados pelos estudantes. Como exemplo, os valores defasados das bolsas de pós-graduação pouco possibilitam a contratação de planos de assistência médica, e a demanda não consegue ser atendida pelas universidades.
Sugestões – McManus apresentou sugestões para uma mudança de perspectiva quanto à pós-graduação e à pesquisa no Brasil. A primeira delas seria a criação de um termo de entendimento sobre a legislação existente, sobre a atuação de cada instituição dentro de um cenário geral de pesquisa, olhando também para eficiência de recursos e de força de trabalho para os pesquisadores. Além disso, a flexibilização dos sistemas de pós-graduação e de suas avaliações, a fim de que levem em considerações as diferenças regionais e entre as instituições, em vez de aplicação de um critério rígido e pouco variável, como é atualmente.
A rubrica única de fonte financeira para a pós-graduação é outra ideia defendida, bem como melhoria na gestão e possibilidades dos cartões pesquisa, hoje regidos unicamente pelo Banco do Brasil. Também a definição de áreas estratégicas para pesquisa nacional, que possam unir pesquisas e profissionais, e o estabelecimento de um regime diferenciado para quem trabalha com pesquisa e pós-graduação, um dos maiores gargalos do sistema.
Indo para conclusão de sua fala, a pesquisadora colocou como metas a serem perseguidas a ampliação da convivência internacional, uma reafirmação de missões das agências de fomento e pesquisa, definindo suas atribuições e atuando efetivamente sobre elas, o protagonismo da pesquisa e o foco na solução de problemas e no resultado. Por fim, o encorajamento para pesquisas de alto risco algo muitas vezes dificultado pela burocracia e pressa em resultados – o que corrobora para pesquisas de menor impacto.
COMUNICAÇÃO SOCIAL Campus Ceres - especial para o 11º CPPG
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